sábado, 14 de novembro de 2009

Vem aí a feira.

A primeira feira de arte em Colónia, aconteceu em 1970 e foi rodeada de grande contestação por um grupo de artistas entre os quais Wolf Wostel, Joseph Beuys e Marcel Broodthaers. Queixavam-se que a feira de Colónia era um momento de "constrangimento criativo e de práticas de exclusão injustas ", "trazido por esta "moda".
O que é um facto é que crescente número de galerias mostrou bem o crescimento de mercado na Alemanha. Seguiu-se a feira Dortmund na qual apenas figurava uma galeria alemã ! A cena artística nos anos 60 na Alemanha cresceu até 73 de 4 para mais de 400 galerias! E com um mercado em crescendo a arte desenvolveu-se bastante, possibilitando uma crescente recepção às práticas contemporâneas. De destacar o facto de artistas como Blinky Palermo e Gerhard Richter serem absolutamente pró mercado em reacção às práticas conceptuais vigentes (a arte conceptual era no início não mercantilizável).
As feiras de arte eram o momento em que todos podiam manusear trabalhos, falar com artistas e galeristas e acima de tudo onde os clientes viam outros clientes a comprar. Tudo isto faz (ia?) uma feira algo de importante para cena artística, criando mais e melhores condições para todos os agentes culturais (oportunidades, visibilidade, mercado).
Em Portugal, ainda não se percebeu que o modelo desta feira é um nado morto.
Não existe aliás uma aparente razão para a feira existir nestes moldes. Porque é que as galerias devem investir tanto dinheiro quando são sempre os mesmos coleccionadores a comprar?
A feira de arte de Lisboa nem sequer consegue ser uma celebração da arte contemporânea, num ambiente festivo onde todos os agentes (artistas, galeristas. curadores, coleccionadores e público) pudessem comungar as suas ideias. Não há festa, não há eventos, nem há um bom bar ou restaurante.
Acima de tudo não há ideias para fazer desta feira, uma boa feira.
Como exemplos que constatei no ano passado, de países periféricos, a feira de Amesterdão, na celebração dos seus 25 anos, solicitou que todas as galerias fizessem exposições individuais o que deu um novo interesse à feira. Foi de facto uma das melhores feiras que vi em termos de legibilidade. A feira de Viena, que tem servido de eixo para o mercado de leste, ofereceu em 2007, lugares para galerias de todos os países de leste que fizeram furor com apresentações ousadas e sem a pressão de ter de vender. Este ano Viena convidou os curadores Dan Cameron, Maria de Corral, Mathew Higgs, Gianni Jetzer e Jerôme Sans para comissariar exposições nas galerias de Viena durante o período da feira.
Existe também um divórcio entre as instituições portuguesas e a feira. Donde se torna tudo mais amador e de menor qualidade. As galerias e instituições portuguesas são também responsáveis pela não proliferação da arte portuguesa na sociedade. Não se compram espaços nas revistas, patrocinando mas também divulgando a sua actividade. Não existe aliás qualquer tipo de estratégia para colocar definitivamente o termo Arte contemporânea na lingua portuguesa, como o Design o fez e a Moda como o seu programa na TV: 86-60-86.
A arte não chega à televisão ou, quando chega, chega mediada. Chega sempre em segunda mão. Não será altura de termos direito a uns minutos de intervenção na primeira pessoa? Parece-me que sim, pois as práticas contemporâneas assim o exigem. Exigem muito mais do que os 0,4% do orçamento do estado para a cultura, onde a arte jaz no fundo, calcado pelo cinema, arquitectura, teatro etc. Mesmo assim, os jovens artistas portugueses correm às urnas para votar, participando activamente no sistema democrático. Pergunto votar em quem? Quem é que dispensou uma palavra que fosse para a Cultura? Para aqueles que acreditam no sistema democrático-capitalista em que estamos inseridos, pois criem um sindicato! Façam uma greve geral, fechem os museus a cadeado, não comprem os jornais que não dão espaço à critica de arte - como me foi sugerido quando auscultei vários artistas para a criação de uma associação.

Voltando à feira, acredito mum modelo mais internacional. Acreditaria mais numa feira que desse condições excepcionais a uma dúzia de galerias novas que trouxesse de todos os cantos do planeta as mais recentes práticas no nosso meio. Acredito num sistema em que todos os anos uma instituição portuguesa fizesse um grande projecto na feira. Imagino que se dessem um bom espaço para um projecto individual de um artista como o Mike Kelley, muitos seriam aqueles que viajariam de propósito à feira. E acredito que umas boas festas não fariam mal a ninguém.
Também acredito que se fizessem alguns comentários podíamos chegar a uma solução a apresentar. Talvez para uma outra feira, desta feita no Porto?

5 comentários:

  1. acrescentava: muitas e boas conferencias c bons convidados nacionais e internacionais + cumplicidade e parcerias entre as galerias

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  2. Olá Inês, Obrigado pela tua colaboração. Sim de facto as conferências são algo que se consegue fazer com custos reduzidos e que podem trazer um acréscimo de capital cultural, que está implícito no pensamento de um programa deste género, e que retorna a um público mais alargado.

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  3. A Arte Lisboa tem os seus problemas, mas não pode ser o bode expiatório de todos os males da Arte Contemporânea. Uma semana de feira não pode corrigir os "males" feitos durante as 51 restantes do ano.
    Pode ser feito mais, mas penso que cabe a todos os referidos agentes, que tomem sobre si a responsabilidade de fazer o seu trabalho e conseguir chegar/criar o seu público.
    Havendo um seguimento extra-mundo da arte, talvez a feira já se encha e haja mais gente interessada, ou disposta a comprar.
    Concordo com o que é dito sobre a imprensa escrita e televisão. Haver essa possibilidade de chegar às pessoas seria importante como primeiro impacto para romper essa tal barreira que separa o público da Arte e que não permite expandir a base de coleccionadores.
    Um exemplo concreto foi os vários sucessos de público nas exposições do CAM, quando foram devidamente assinaladas na televisão.
    Há muito que se pode fazer, mas importante é encontrar uma estratégia e haver dinheiro e vontade de todos em que se realize.
    Não penso que a responsabilidade deve caír totalmente sobre o Estado, nem tão pouco ficar exclusivamente nas mãos dos galeristas.
    Deve existir um acordo entre todos.

    Quanto à entrada de mais galerias espanholas na feira... isso pode não ser necessáriamente mau. Pelo menos do ponto de vista dos artistas.

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  4. Caro (a) PdR,
    Os artistas portugueses, sentem-se mal; Oprimidos pelo gosto não informado da pequeno-burguesia portuguesa e entalada no provincialismo dos jovens curadores que, com duas exposições comissariadas, recebem maior atenção e respeito. Sabes que para os 7 artistas ao 10ºmês- na Gulbenkian, os jovens artistas têm de gastar todo o dinheiro em materiais (vivem do quê)? E que essa quantia é metade do que o curador recebe como "fee"? Sabes que a crítica literária tem 3 , 4 pessoas a escrever sobre 6 a 8 livros de natureza variada enquanto nós temos um gajo que escreve sempre sobre os mesmos amigos? Que a Culturgest programa de forma circular entre chiado 8, Culturgest Lisboa e Porto sempre o mesmo pequeno grupo de artistas -e faço questão de salvaguardar, a belíssima programação que têm feito que ao mesmo tempo é uma mais valia, mas que se encerra sobre uma falta de curiosidade no todo por parte dos intelectuais que marcam esse gosto absorvido pela pequeno burguesia.
    Queremos mais! Queremos tudo!
    Os project rooms da feira são vergonhosos! o bar está melhor e as galerias boas estão todas a fugir. Algo está mesmo mal.

    Ah! Também quero reforçar que, reportagens e tempo para os artistas fazerem as suas próprias intervenções são coisas completamente diferentes!

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  5. Olá novamente.
    (É caro Pedro)

    Não me queria desviar do assunto "Arte Lisboa", pois era sobre isso que se estava a falar, assim como de outras formas de se chegar ao público (e aqui o CAM foi apenas um exemplo de como os anúncios na TV chamam mais público fora do circuito; poderia também falar da popularidade de alguns artistas plásticos, que aos olhos dos menos informados são a resposta natural, quando são interpelados acerca se conhecem algum(a) artista plástico(a) em Portugal).
    Infelizmente não pude estar presente na edição da Arte Lisboa deste ano (tal como também não pude estar na edição anterior), mas sei que existe essa desilusão constante por se sentir que os stands são muito caros e que os coleccionadores são sempre os mesmos e compram sempre a mesma coisa, muitas vezes aconselhados pelo mesma pessoa de sempre (mais ou menos ligado a alguma galeria).

    A minha pergunta mantém-se. O que se anda a fazer nas restantes 51 semanas do ano?

    Não creio que todos os problemas do mercado se solucionem com a organização de uma Super Feira de Arte Contemporânea em Lisboa (com um melhor bar) e que alguma empresa de comunicação adjudicada à "lavagem de cara" decida que o nome é que é o problema e que se tenha de mudar para "AlllArtLisbonSuperStar".

    Poria de fora os críticos e as instituições, por agora, e concentraria-me no mercado.
    Há claramente um problema e chama-se ausência de mercado. Falta de estruturação e estratégia, que passa por manter todos os agentes envolvidos, a desenvolver o seu trabalho, sem que seja necessário sofrer pressões comerciais.

    Aqui sim, "Os artistas portugueses sentem-se mal" e compreende-se pelo exemplo que deste (que é um de muitos e de facto escandaloso), pois os meses ou semanas de trabalho são compensados com a possibilidade de produção, mas não de algum sustento - a possibilidade de expor numa exposição como um 7/10 é dada como "a grande oportunidade"... porque de facto não há muitas mais... e uma relação que deveria ser equilibrada transforma-se numa relação onde há claramente um poder que domina.
    Se o requisito dos 7/10 é dar a descobrir novos artistas, sem galeria, então que como é que é possível que alguém consiga produzir nestas condições? Só mesmo com "paitrocínios".

    Agora pergunto: quem deveria ajudar a fomentar o mercado da Arte? O Estado? As Fundações? Ambos?...
    E as galerias? Qual é o papel que deveriam ter dentro deste contexto?
    Não deveriam ser elas a ajudar a suportar parte destas despesas de produção e sustento (ou em caso de elas mesmas não terem condições, de serem elas a angariar apoios para tal), quando os artistas fazem sacrifícios para poder expor fora dos circuitos comerciais e ter uma presença alargada dentro desse mesmo contexto?
    Como é que se cria o "awareness" na Arte? Inagurando exclusivamente nas galerias ou tendo também o seu trabalho exposto fora do circuito comercial?
    Talvez necessite haver um equilibrio entre os dois...

    Ajudaria talvez que houvesse uma certa cooperação entre galerias; que se desse mais apoio a espaços independentes para que os seus artistas, e outros, possam ter outras possibilidade de expor o seu trabalho.

    Há muita coisa a mudar em 51 semanas, do que esperar que uma no ano, mude tudo.

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