O concerto de Sonic Youth, em Lisboa, acabou com duas guitarras e um baixo apontados perpendicularmente aos amplificadores.
O feedback construiu uma nuvem ácida que nos tomou conta do corpo e dos orgãos. Abandonadas sobre os amplificadores, as guitarras continuaram a produzir uma ressonância que preencheu o espaço até que as luzes se acenderam; quando um membro do staff desligou os amplificadores, um a um, empurrando-nos para fora.
Um pequeno som continua na minha cabeça - o som visual dos dois targets de Jasper Jonhs pintados nos amplificadores de Lee Ranaldo.
No cenário, pobre no mais belo sentido da palavra, lençóis com corpos delineados a fogo em homenagem a Yves Klein são prevertidos por um jogo de luzes, que os retiram do imaterial. É uma arte sensorial, que nos lavra o corpo, que nos toca como uma bateria. As dissonâncias que nos agarram à história, do Schoenberg ao Cage, retornam a um rock emotivo. Parecem querer gritar, que estão ali, que estão atentos ao mundo e nada contentes com este. Que ainda acreditam que o podem mudar, ou que não se dão por vencidos.
Há arte que não é para meninos.
Esta era frase que me atacava após o concerto. Saí dali sem palavras e sem capacidade para organizar discurso. Telefonaram-me a convidar" para um copo" e a dizer "ganda concerto!", o que ainda me atordoou mais.
Sei que tinha de assinalar este acontecimento, que tinha que escrever ainda que não soubesse como o fazer. Estamos a presenciar que afinal não se envelhece e se desiste. Não passamos os 50 e passamos a cuidar apenas do quintal (conceptual) que construímos na flor da nossa juventude e no auge da nossa condição activa. Há mais e a evolução orgânica dos Sonic Youth, presenteia-nos também com essa possibilidade.
Grande abraço,
ResponderEliminarMicael