domingo, 22 de novembro de 2009

Anos 70

Não me sinto intitulado para reflectir sobre os anos 70 em exposição no CAM da Fundação Calouste Gulbenkian. Não me cabe a mim re-territorializar este período do ponto de vista crítico. Mas não posso deixar de dizer que como em todo o mundo, onde os museus têm vindo a fazer as primeiras incursões historicistas a este período, os anos setenta são de importância vital para aquilo que fazemos hoje, podendo dizer que os anos setenta se tornaram numa geração fetiche.
São aliás amplamente reconhecidas as estratégias conceptuais de vários jovens artistas portugueses que asssim resgatam do passado um capital intelectual que teimava ser esquecido, tornando-se esse resgate, também um escudo intelectual ou ferramenta retórica que puxa o espectador para um determinado tipo de reflexão, para além do estético.

















O conjunto de trabalhos exibidos no CAM, podiam estar em qualquer outra parte do mundo. Podiam ter acontecido na Polónia (1) ou na América Latina, pois pertencem a um movimento que se tornou global, onde as mudanças socio-políticas se repercutiram de forma intensa no plano artístico, não sendo possível por vezes, separar uma acção artística de uma demonstração política. Os anos setenta foram acima de tudo o momento onde as várias partes do todos se imiscuíram. Como exemplo maior, a exposição "When attitudes become form " que Harald Szeeman comissariou na Kunsthalle Berne em 1969, onde pela primeira vez se institucionalizou a pluralidade de géneros, conseguindo ter na mesma exposição vários media e sujeitos temáticos, assim como estilos ou variações estéticas.
No nosso imaginário fica marcado o ano zero da arte contemporânea em Portugal com a realização da "Alternativa zero" , organizada por Ernesto de Sousa em 1977 na Galeria Nacional de Arte Contemporânea em Lisboa (para saberem mais por favor consultem o site http://www.ernestodesousa.com) , juntando artistas que não tinham afinidade pessoal ou artística e sugerindo a ideia de um todo a partir de partes diversas.
Esta característica está aliás presente na exposição do CAM. Não há melhores nem piores artistas, há sim um todo que tem repercussões na sua dinâmica. Uns desapareceram , mas todos se fazem sentir como peças úteis para o desenvolvimento daquele que é hoje o nosso chão cultural, a partir do qual devemos exigir um movimento progressivo, cultural, político e social.

(1) Para maior aprofundamento deste tema leia "68, Revolution I love you - art, politics and philosophy", catálogo publicado pela Miriad Manchester University , 2008 (ISBN 1905476345) por Maja e Reuben Fowkes (ver também em http://translocal.org/revolutioniloveyou/).

1 comentário:

  1. Acabei de o ler. Considero tratar-se de um bom artigo, acredite.
    Nunca mais acabaríamos de referenciar e trazer ao presente alguns dos acontecimentos do passado artístico não muito distante. É assim mesmo, não é? Sempre foi. Será, certamente, mais que um exercício: talvez um gesto reflexivo, e imperativo, esse, de colocar em fila de pirilau a tralha toda para que o caminho realizado por outros, entre os possíveis que se fizeram, se torne visível, substancial aos que hão-de chegar. No entanto, acredito que os limites do visível encerram, quase sempre, para lá das circunstâncias sociais em que surgiram os objectos originais, a notificação do nosso presente, o sentido do nosso gosto, e, por vezes, a superficialidade da moda. Ainda assim, é bom que esta reflexão se faça, que se mantenha viva uma certa visão que não consigo considerar histórica, ainda que contenha erros de interpretação ou uma visão poluída.
    Gosto daquele Lapa: é uma imagem brutal cujo poder estetizante não deixa de ser, igualmente, reflexivo.

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