sábado, 13 de junho de 2009

António Variações

(e agora algo completamente diferente)



Faz hoje, dia de Santo António, 25 anos que António Variações morreu.
Há 3 anos li a sua biografia (António Variações - entre Braga e Nova Iorque, Manuela Gonzaga, Âncora Editora, 2006) e fiquei tremendamente impressionada.
Depois ouvi tudo o que havia para ouvir, prestei atenção ás letras, e cheguei mesmo, nesse verão, a fazer um desvio nas minhas férias para no Minho profundo procurar a casa onde cresceu. Tive que lá ir, não conseguia compreender como é que alguém que nasceu naquele contexto social e cultural se tenha tornado nesta figura fora do tempo, fora de todos os tempos talvez.
A resposta é avassaladoramente simples: António Variações já nasceu artista. Não é um artista à força, não começou a cantar por capricho ou por vaidade, sempre cantou e sempre quis cantar. Toda a sua vida (desde que saiu sozinho aos 12 anos em direcção a Lisboa para trabalhar numa mercearia) foi guiada pela intuição e por uma enorme urgência em deixar uma obra feita, em fazer parte da História. Mas até chegar á música António passou vários anos a apreender o mundo; estudou, trabalhou, esteve no Ultramar, viajou, passou por Londres (onde visitou “do museu à discoteca”), viveu na Holanda, aprendeu a arte de cabeleireiro… sempre ávido de conhecimento, de renovação e de mudança.
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Num percurso de enorme solidão, cheio de tentativas, decepções e sacrifícios, António consegue em 1978 assinar um contrato com a editora Valentim de Carvalho, mas foram precisos 5 anos para que gravasse o 1º albúm. A verdade é que era difícil situá-lo, enquadrá-lo e como não sabia tocar nenhum instrumento nem lia pautas, dependia de uma nova geração de músicos que o pudessem acompanhar. António Variações, músico autodidacta, cantor desde sempre, tinha bem definido como é que a sua música deveria soar e descrevia essa sonoridade aos outros músicos através de figuras de estilo como: ”algo entre Nova Iorque e a Sé de Braga”, “algo que faça o chão tremer”, “algo que ponha toda a gente a cantar”.
As "partituras" de António eram umas cassetes gravadas em casa, apenas a sua voz e uma caixa de ritmos manhosa, quase nada mas tudo ao mesmo tempo.
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A palavra Variações segundo ele “é uma palavra extremamente elástica, portuguesa e que não me deixa limitado a uma área musical, é o nome adequado para fugir à rotina, é um nome que não me escraviza e não me deixa comprometido com rótulos, o que é excelente para mim.”
Em relação à sua figura excêntrica ele diz:
“ tem a ver com a minha liberdade. Visto-me assim diferente e colorido, porque me sinto bem. No entanto, nunca me preocupei com a moda. Preocupo-me sim, com a estética”.
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Amália terá sido, sem sombra de dúvida, a maior inspiração para António Variações mas também encontramos na sua eleição os Beatles, Roling Stones, Talking Heads, Roxy Music, David Bowie, OMD, New Order. Não interessa tentar rotular o que não é etiquetável (nem o quer ser), a música de António Variações é a sua identidade, as letras autobiográficas (tão particulares mas universais na compreensão da natureza humana), o colorido, o folclore, o rock, a fusão do passado e futuro e a energia são de quem sente a vida a latejar.
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António Variações era um homem comprometido apenas com a liberdade do seu espírito, viveu intensamente como só as pessoas sem medo vivem. Segundo relatos sobre a sua maneira de ser e estar encontramos adjectivos tão extremados como: provinciano, mais animal que racional, anarquista, pacifista, curioso, insatisfeito, tímido, satírico, perfeccionista, trabalhador, autoritário, doce, secreto, calmo, por vezes intratável, carinhoso, simples, extravagante, introvertido, um anjo mal disposto, uma ave rara.

E o que é que isto tem a ver com arte? Muita coisa.

3 comentários:

  1. Um video à Kenneth! a estátua com as bananas é muito boa. E a cena da cozinha...

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  2. É o maior, o António. É tão bom dizer coisas parvas como esta... E ainda sabe melhor porque não é propriamente parva. É preciosa a maneira como ele sempre assumiu que queria ser popular, que queria dar e receber, abertamente, sem ceder um milimetro naquela sua austeridade espalhafatosa. Ah, e sem ter a mania da profundidade andava sempre perto da Fonte. É o maior. Viva!

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