terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Isto é pintura! #2














A exposição "A analogia do olho"de JCJ Vanderheyden patente na Culturgest em Lisboa é uma exposição conceptual?
Esta pergunta é feita sem qualquer tipo de desdém. A questão prende-se à ortodoxia dos pintores, à filiação da pintura a grupos menores de pensamento, àqueles que tendem a não incluir a pintura como parte de um todo, tendendo a tornar esta um guetto, fixando-a num local e tempo definidos.
Esta exposição despoletou conversas à posteriori nas quais se falava ora com entusiasmo ora com desdém da pinturas de Vanderheyden. Na sua maioria, o descontentamento tem a haver com o facto "...daquilo não serm boas pinturas, de desrespeitarem a Pintura!".
São de facto melhores as noções espaciais em Barnett Newman, mas estas pertencem a um outro modo ou sistema (que é o da representação negativa). E de facto a re-apresentação de uma obra, em diferentes accrochages são herdados de Malevich. Ambas as filiações são dados positivos para a construção de um problema ou a identificação de um pensamento a desenvolver.
Esta exposição não é uma exposição para pintores mas uma exposição para todos. É uma exposição generosa que dá a ver o impulso erótico do pensar de Vanderheyden. A utilização de diferentes modos de modos de apresentação e representação (re-apresentação) da sua obra bem como o re-enquadramento  da reprodução de outras obras de arte são para parafrasear Derrida, uma actividade canibalística. O canibalismo de que aqui falamos é o da assimilação (ver entrevista de Daniel Birnbaum e Anders Olson :"An interview on the limits of digestion" em http://www.e-flux.com/journal/view/33). Uma incorporização, através da experiência, que neste caso se estende ad infinitum pelo permanente movimento, fruto de um impulso erótico que se traduz na vontade de adquirir aquilo que não se tem.

A sua obra, começada entre as duas guerras mundiais, é constituída por um conjunto de elementos que estão directamente ligados à história da pintura.
Na abstracção, que me parece neste caso ser não uma negação do mundo mas uma sublimação deste, resultam pinturas formais que colocam o espectador sozinho consigo mesmo. E as pinturas figurativas, que tomam como ponto de partida, vistas aéreas feitas através das janelas de um avião , tentam ser esse espaço de encontro com a densidade do mundo e remetem-nos para um tempo que diz sempre ser superior a nós mesmos.
Muitas destas pinturas são bad paintings - mas afinal o que é que são más pinturas?- sem um interesse pela pintura como técnica.  Aliás tornando-se interessantes a partir do momento em que desrespeitam os códigos instituídos do que é uma boa pintura, fazendo uma escolha entre certa densidade que vem de uma certa forma de estar no mundo ao invés da escolha por uma pintura que fareja a boa pintura - feita por aqueles que vão ver pintura para perceber como as pinturas foram feitas.
As pintura figurativas de Vanderheyden partem de um momento ideal - a fotografia aérea feita através da janela de um avião - perdendo-se a hipótese de repor essa experiência e, encontrando-a num último momento que não resulta da sua duplicação técnica (o que resultaria em erro) mas sim na reconstrução desta experiência através de outros  símbolos, o que revela um certo carácter expressionista nas obras.
Um terceiro elemento são as imagens  que reproduzem  obras de arte (reproduções de reproduções)  que se desdobram ainda em fotografias de motivos de pinturas e reproduções /variações dos seus próprios trabalhos.

Não quero compreender (identificar um príncipio e um fim) estas pinturas. Quero antes sentir a sua presença no mundo e a forma como estes valores (as várias obras) constituem discurso através da repetição das obras, variações no tamanho e inter-relação destas.
Para mim não existe uma diferença abissal entre os objectos (as portas ou locais de fruição) estética criados por Vanderheyden), as suas pinturas formais, as suas paisagens, as reproduções das suas obras e daquelas que foram de outros e agora são também suas.
É sempre o mesmo trabalho, uma pintura retiniana que ao mesmo tempo evoca uma experiência do corpo; Uma memória do corpo.
Aliás é na transformação da memória, nas suas variações entre maqueta, obra, reprodução e projecção que a obra de Vanderheyden corta com a evolução cronológica da sua obra; Para a poder estruturar rizomáticamente nas mais variadas relações como o mundo, desterritorializando-o e ao mesmo tempo deixando o mundo territorializar a obra para poder iniciar um movimento ad eterno.

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